Então chegou aquela fase na vida dos filhos que todo pai, por mais que tema, sabe que vai ter de enfrentar. Quem já passou por isso sabe o tamanho do desafio, e os que ainda não tiveram a chance, certamente imaginam o que vem pela frente.
De repente, mudam a voz, o corpo, o comportamento e, acima de tudo, começam a cristalizar uma identidade própria. Essa é a adolescência, aquele famoso período em que as crianças amadurecem rumo à vida adulta. É uma fase bonita de transformação, em que conflitos são naturais e recorrentes. Afinal, quem disse que é fácil ver o corpo e a cabeça mudarem drasticamente? Sair do universo infantil para encarar o mundo adulto? Por isso, insatisfações são normais e fazem parte desse período, porém quando ganham proporções exageradas e interferem no cotidiano dos adolescentes, é hora de ligar o alerta vermelho e procurar um especialista.
Estudo epidemiológico feito pela pediatra Ana Elisa Ribeiro Fernandes, do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mostrou que 62,6% dos alunos de 6 a 18 anos matriculados nas escolas de Belo Horizonte estavam insatisfeitos com o próprio corpo, embora mais de 80% do total estivessem dentro do peso normal. Foram observados 1.183 alunos: 34% preferiam ser mais magros e 29% gostariam de ganhar peso. Entre os insatisfeitos, 32% eram homens e 30,6%, mulheres.
A busca pela aceitação e por uma identidade própria pode se tornar obsessiva e desencadear transtornos que nem sempre são detectados pelos pais e que colocam em risco a saúde e o desenvolvimento dos filhos. “O que o adolescente quer é ser aceito e para isso ele precisa ter todos os requisitos do que é considerado ideal. Aí entra a questão do corpo, da magreza, do padrão de beleza atual”, afirma a pediatra Simone Lotufo, do Fleury Medicina e Saúde.
Ela explica que o adolescente de hoje tem um desafio duplo: superar os conflitos naturais dessa fase de desenvolvimento e ainda lidar com as pressões da sociedade contemporânea, que valoriza de maneira extremada a aparência, o corpo perfeito, o encaixe em um modelo divulgado pela propaganda e pelos meios de comunicação. Em resumo, hoje a exigência é maior. “Antigamente, até as misses tinham um corpo mais natural. Hoje, as meninas estão muito mais voltadas para a questão física. E os meninos também estão se preocupando mais com isso”, observa.
Ser magro tornou-se sinônimo universal de beleza, felicidade, aceitação e aprovação, modelo que estimula a oferta de uma infinidade de dietas milagrosas e soluções mágicas a curto prazo, como cirurgias e tratamentos estéticos. “A grande diferença é que hoje os adolescentes têm muito mais facilidade de acesso a informações dos grupos, via televisão, computador, shows, revistas e outros meios”, explica o dermatologista Luiz Guilherme Martins Castro, do Fleury. “Eles são expostos com uma freqüência maior a uma idéia de grupo e ficam literalmente massificados. Do ponto de vista visual, a identificação com o grupo é gigantesca – seja na roupa, na fala e no corpo considerado ideal”, completa.
Para superar essa fase e ajudar seus filhos a ter uma adolescência tranquila, saudável e livre de traumas, os pais devem prestar muita atenção às mudanças que ocorrem nessa idade. Nas meninas, as transformações começam a partir dos 8 ou 9 anos, com alterações que vão desde o alargamento de ombros e quadris até o desenvolvimento de ovário, útero e mamas, além do surgimento de pelos púbicos, axilares, faciais e nos membros. Nos garotos, há a fase do estirão de crescimento, seguida da mudança na voz, do nascimento da barba e do desenvolvimento dos órgãos genitais. Em ambos, há ainda a explosão da sexualidade. Cabe aos pais atentar para a alimentação e os pequenos sinais de alerta, como desânimo prolongado, falta de vontade de sair de casa ou mesmo exagero na academia.
“Os primeiros sinais de distúrbios de imagem aparecem muito cedo – há estudos que apontam para os 13 anos. Em muitos casos, essa insatisfação acaba sendo resolvida dentro de casa, com elogios e incentivos dos pais. Em outros, quando não há esse apoio, o problema se desenvolve até desencadear, anos depois, uma doença psiquiátrica que precisa de tratamento”, explica Luciana Conrado, dermatologista da Sociedade Brasileira de Dermatologia, especializada em distúrbios de imagem nessa faixa etária pela Universidade de São Paulo (USP). Ela explica que muitos pacientes que chegam ao consultório do dermatologista em busca de cirurgias e de mil tratamentos diferentes, sem nunca ficarem satisfeitos, na verdade apresentam algum distúrbio.
Um exemplo fácil: é normal que o adolescente se sinta incomodado por ter espinhas no rosto. Não é normal que ele não queira mais sair de casa e passe o dia trancado no quarto por causa disso.
Adolescentes que aprendem a gostar de si e crescem aceitos exatamente como são se tornam adultos muito mais maduros e menos inseguros. Talvez mais bem preparados para enfrentar os dilemas da adolescência de seus próprios filhos.
Sinais de alerta
Saiba quando uma preocupação é normal para a idade e quando ela é excessiva. É preciso observar, pois alguns comportamentos dão indícios de problemas como bulimia ou anorexia.
- É natural que, na adolescência, meninas se incomodem com o peso;
- Nessa fase, há uma preocupação com a aparência, com as roupas, o cabelo. Isso é normal;
- Olhar-se e observar-se na frente do espelho faz parte do reconhecimento do próprio corpo.
Normal
- Mas é demais quando elas, preocupadas com a balança, passam a tarde inteira na academia;
- Parar de comer ou evitar refeições com a família e até com outras companhias também é um sinal de alerta;
- Ficar em jejum por muitas horas também não faz bem. Se esse comportamento se prolonga, é bom ficar atento;
- Deixar de sair de casa por conta da aparência e repetir esse comportamento muitas vezes não é um bom sinal;
- Passar horas se observando na frente do espelho, e apontando defeitos inexistentes na aparência, pode ser um sinal de alerta.
O que é excessivo
Fonte: Fleury - Dra. Simone Lotufo, pediatra, Dr. Luiz Guilherme Martins Castro, dermatologista, do Fleury Medicina e Saúde e Dra. Luciana Conrado, dermatologista da Sociedade Brasileira de Dermatologia, especializada em distúrbios de imagem nessa faixa etária pela Universidade de São Paulo (USP).
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